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A verdade dos fatos

Depois de um dia inteiro de votação, Jair Bolsonaro (PSL) soube que estava eleito presidente do Brasil por volta de 19h20 do dia sete de outubro, apenas vinte minutos após o encerramento da votação no Acre, último estado a ir às urnas, por conta do fuso horário. Àquela altura, 94% dos votos de todo o país já tinham sido apurados, e o capitão da reserva não podia mais ser alcançado por Fernando Haddad (PT). Uma disputa que se revelou bem mais previsível que a primeira incursão do presidente eleito nas urnas, trinta anos antes, quando iniciou a vida política no Legislativo, eleito vereador do Rio em pleito realizado dia 15 de novembro.

Impulsionado por uma entrevista à revista Veja em 1987, na qual, ainda na ativa, o capitão do Exército revelava o plano de oficiais de explodir bombas em quartéis para reivindicar aumento salarial, Bolsonaro receberia 11.062 votos que fizeram dele o 16º vereador mais votado daquela legislatura. Então com 33 anos, o único representante do PDC no Palácio Pedro Ernesto só saberia de todos esses detalhes 12 dias depois do pleito. Com sucessivos atrasos no cômputo dos votos e diante de diversas denúncias de fraude, o TRE-RJ demorou para apresentar um resultado conclusivo, precedido de sete balanços parciais.

Na edição do dia 27 de novembro daquele ano, com 99,06% das urnas apuradas, O GLOBO apresentou assim o perfil do vereador: “Eleito pelo modesto PDC, o Capitão do Exército Jair Messias Bolsonaro pretende reestabelecer a moralidade na Câmara Municipal e resolver o que ele chama de ‘crise de homens’ na política do Rio. Bolsonaro, que entrará para a reserva, foi julgado e absolvido por ter participado da Operação ‘Beco Sem Saída’, que visava a explodir alguns banheiros das unidades do Exército do Rio, para reivindicar melhores salários’.

O resultado foi uma vitória para uma eleição que, dia antes, parecia perdida. No dia 17 de novembro, uma matéria do GLOBO com a apuração das primeiras urnas da Vila Militar apontavam para uma provável decepção do militar “O capitão paraquedista do Exército Jair Messias Bolsonaro parece estar às vésperas de uma grande desilusão. Candidato a vereador pelo PDC, ele contava com o apoio maciço de seus colegas da Vila Militar e alimentava esperanças de ser o ‘puxador de votos’ do partido. Mas as duas primeiras urnas abertas na 23ª Zona Eleitoral (Magalhães Bastos), onde há muitos eleitores da Vila, lhe deram apenas sete votos”, dizia o texto.

A estada do então vereador na Câmara do Rio foi efêmera. Em 1989, ele foi eleito deputado federal, levando para Brasília aquela que seria a principal marca de sua atividade política: a defesa dos interesses dos militares e de seus familiares. Os colegas da primeira legislatura, de diferentes matizes ideológicos, lembram de Bolsonaro como um vereador discreto, silencioso e pouco afeito à articulação política. Ainda na casa, Fernando William (PDT), que foi colega de Bolsonaro também em Brasília, como deputado, diz que o presidente eleito era pouco envolvido com os assuntos pertinentes ao legislativo carioca:

– Ele chegava, votava de acordo com a consciência dele e ia embora. Não era atuante em termos de apresentação de projetos, de participação em comissões ou de ocupação da tribuna, por exemplo. Se ele a ocupou dez vezes neste período, foi muito. Ele tinha uma atitude muito parecida com a que tem hoje o filho dele – afirma, em alusão a Carlos Bolsonaro (PSC), caçula do clã político e licenciado do cargo.

Naquela legislatura, o vereador percebido como vilão por boa parte da casa era outro: Wilson Leite Passos (PDS), terceiro mais votado, com pouco mais de 34 mil votos. Autor do pedido de impeachment de Getúlio Vargas, em 1954, apoiador da ditadura militar, negacionista do holocausto e criador do Serviço Municipal de Eugenia, o vereador morto em 2017, vítima de um câncer de pulmão, tinha sua atuação combatida por diversas bancadas. Mas os vereadores da época negam que houvesse semelhanças políticas ou alianças entre os dois:

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— Wilson Leite Passos ocupava diariamente a tribuna da Câmara e era menos tosco. Havia preparo na defesa daqueles temas. O Bolsonaro sequer tinha clara a diferença entre direita e esquerda, e frequentemente votava com a esquerda, que tinha uma agenda forte de moralidade e combate à corrupção e aos interesses da especulação imobiliária e da Fetranspor na cidade, por exemplo – explica Fernando William.

Vereador mais votado daquela eleição, com 43.452 votos, o ambientalista Alfredo Sirkis (PV) concorda:

— Passos tinha uma atuação bem mais articulada que a de Bolsonaro. Os dois eram de direita, mas não tinham proximidade e nem votavam em bloco — avalia o ex- candidato à presidência de 1998.

ATUAÇÃO EM PLENÁRIO

Na eleição de 1988, o eleitor carioca transmitiu pelas urnas um recado: queria renovação. Mesmo com a ampliação de 33 para 42 representantes no parlamento municipal, apenas 13 vereadores seriam reconduzidos ao cargo pelo eleitorado: àquela altura, a reeleição só era proibida para o Executivo. Embora tenha conseguido eleger o prefeito Marcelo Alencar, o PDT de Brizola perdeu representação na casa: caiu de 16 para 10 assentos.

Hoje deputado estadual pelo PSOL, Eliomar Coelho foi eleito vereador pelo PT naquele ano, depois de assumir, como suplente, a cadeira de Benedita da Silva (PT), eleita deputada federal em 1986. Para Coelho, desde o início, estava claro o caráter político do presidente eleito:

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— Sem dúvida ele era de direita, mas não era um vereador engajado nos temas da cidade. A prioridade dele era a defesa dos interesses dos militares e reivindicações salariais. Por isso marchou logo para Brasília: não há muito que possa ser feito por eles em âmbito municipal — analisa.

Filha do ex-senador Gérson Carneiro, a deputada federal Laura Carneiro (DEM) estreava nas urnas naquela eleição, quando foi eleita vereadora. Ao longo de mandatos de deputada federal, ela acompanhou a transformação do comportamento do então colega também em Brasília. E lembra que a primeira parte do mandato dos vereadores daquela legislatura tinha um objetivo bem específico: a elaboração da Lei Orgânica do Município, legislação superior da cidade.

— Éramos todos muito jovens, patos novos, mesmo. Estávamos começando. Bolsonaro era cordial, gentil, mas na dele. Era ainda mais introspectivo do que é hoje. Aos poucos, foi melhorando com relação a isto. As sucessivas eleições vão empoderando o político e ele fica mais à vontade — afirma.

Dois anos depois, a família Bolsonaro teve outra representante no parlamento carioca. Já em Brasília, o capitão lançou a então mulher, Rogéria Bolsonaro, como candidata. Com cerca de sete mil votos, ela foi eleita vereadora. O casal se desentendeu por conta de divergências com relação às posições tomadas por Rogéria na casa. Em 2000, a aposta foi o filho caçula do casal, já separado: Carlos, reeleito sucessivamente desde então.

Naquela legislatura, o vereador percebido como vilão por boa parte da casa era outro: Wilson Leite Passos (PDS), terceiro mais votado, com pouco mais de 34 mil votos. Autor do pedido de impeachment de Getúlio Vargas, em 1954, apoiador da ditadura militar, negacionista do holocausto e criador do Serviço Municipal de Eugenia, o vereador morto em 2017, vítima de um câncer de pulmão, tinha sua atuação combatida por diversas bancadas. Mas os vereadores da época negam que houvesse semelhanças políticas ou alianças entre os dois:

Wilson Leite Passos ocupava diariamente a tribuna da Câmara e era menos tosco. Havia preparo na defesa daqueles temas. O Bolsonaro sequer tinha clara a diferença entre direita e esquerda, e frequentemente votava com a esquerda, que tinha uma agenda forte de moralidade e combate à corrupção e aos interesses da especulação imobiliária e da Fetranspor na cidade, por exemplo – explica Fernando William.

Vereador mais votado daquela eleição, com 43.452 votos, o ambientalista Alfredo Sirkis (PV) concorda:

— Passos tinha uma atuação bem mais articulada que a de Bolsonaro. Os dois eram de direita, mas não tinham proximidade e nem votavam em bloco — avalia o ex- candidato à presidência de 1998.

ATUAÇÃO EM PLENÁRIO

Na eleição de 1988, o eleitor carioca transmitiu pelas urnas um recado: queria renovação. Mesmo com a ampliação de 33 para 42 representantes no parlamento municipal, apenas 13 vereadores seriam reconduzidos ao cargo pelo eleitorado: àquela altura, a reeleição só era proibida para o Executivo. Embora tenha conseguido eleger o prefeito Marcelo Alencar, o PDT de Brizola perdeu representação na casa: caiu de 16 para 10 assentos.

Hoje deputado estadual pelo PSOL, Eliomar Coelho foi eleito vereador pelo PT naquele ano, depois de assumir, como suplente, a cadeira de Benedita da Silva (PT), eleita deputada federal em 1986. Para Coelho, desde o início, estava claro o caráter político do presidente eleito:

Sem dúvida ele era de direita, mas não era um vereador engajado nos temas da cidade. A prioridade dele era a defesa dos interesses dos militares e reivindicações salariais. Por isso marchou logo para Brasília: não há muito que possa ser feito por eles em âmbito municipal — analisa.

Filha do ex-senador Gérson Carneiro, a deputada federal Laura Carneiro (DEM) estreava nas urnas naquela eleição, quando foi eleita vereadora. Ao longo de mandatos de deputada federal, ela acompanhou a transformação do comportamento do então colega também em Brasília. E lembra que a primeira parte do mandato dos vereadores daquela legislatura tinha um objetivo bem específico: a elaboração da Lei Orgânica do Município, legislação superior da cidade.

— Éramos todos muito jovens, patos novos, mesmo. Estávamos começando. Bolsonaro era cordial, gentil, mas na dele. Era ainda mais introspectivo do que é hoje. Aos poucos, foi melhorando com relação a isto. As sucessivas eleições vão empoderando o político e ele fica mais à vontade — afirma.

Dois anos depois, a família Bolsonaro teve outra representante no parlamento carioca. Já em Brasília, o capitão lançou a então mulher, Rogéria Bolsonaro, como candidata. Com cerca de sete mil votos, ela foi eleita vereadora. O casal se desentendeu por conta de divergências com relação às posições tomadas por Rogéria na casa. Em 2000, a aposta foi o filho caçula do casal, já separado: Carlos, reeleito sucessivamente desde então.